domingo

A claridade invadiu o cômodo pela janela entreaberta, e mesmo que protestasse acordou-me.Rodei os olhos pelo quarto pequeno e acabei por ver os mesmos pertences usados e envelhecidos.Deparei-me mais uma vez com o lado esquerdo da cama mole de casal vazio.Levantei e sem passar pelo banheiro ou trocar de roupa,desci até a cozinha.Ignorei  toda a bagunça e toda a sujeira acumuladas.Andei a paços lerdos e senti meu coração palpitar fortemente ao deparar-me com olhos verdes fitando-me, vindos de alguém escorado na pia encardida.A mesma imagem, fazendo-lhe total justiça,o corpo magro, o cabelo eriçado e alaranjado e a mesma ironia estapada, a face petrificada em perfeição.Perfeição que a muito já havia deixado este mundo.Meus olhos questionaram minha sanidade e indagaram se a imagem tratava-se de uma lembrança repetida em mais um sonho.Meu garoto não mais existia, foi-se.Mas meus olhos o viam, ele existia para minha visão.Andei,temendo,em sua direção,direcionando-me apenas por seus olhos duros e verdosos.Levei minhas mãos a tocar seu rosto e tracei calmamente seus traços perfeitos.Não existia apenas para minha visão, existia também para minhas mãos e para todo o meu corpo.A dor invadiu meu peito, avisando-me da insanidade.Algo cuspia de minha garganta e eu queria perguntar-lhe algo.
 - Por favor,... - sussurrei rouca.Ele apenas sorriu e seus braços envolveram meu corpo.Não me importava que fosse insano acreditar que ele ainda vivia.Era feliz e arrancava de meu peito toda a dor.Insano ou não,deixei que seu abraço durasse por mais tempo, e se não fosse pedir de mais,que durasse para sempre.

Um comentário:

Ana Paula disse...

Otimo o seu texto , ameeei <3

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